O homicídio passional no Tribunal do Júri (I)
Até a chegada do Código de 1940, eram comuns as absolvições de réus por homicídio doloso (tentado ou consumado) contra mulheres, sob a tese de “crime passional”. A base era o art. 27, § 4º, do Código Penal de 1890 (Dec. de 11/10), que declarava: “Não são criminosos os que se acharem em completa privação dos sentidos e da inteligência”.
O genial NÉLSON HUNGRIA, em conferência proferida na Faculdade de Direito de São Paulo, nos anos 40, protestou com veemência: “O caluniado Código de 90 fôra metamorfoseado, pela espetacular e profusa oratória criminal, desorientadora da justiça ministrada pelos juízes de fato, num espantalho ridiculamente desacreditado. Foi o período áureo do passionalismo sanguinário, que andava à solta, licenciado sob a estapafúrdia rubrica de ‘privação dos sentidos e da inteligência’”. Na mesma oportunidade, denunciou: “A nossa bibliografia jurídico-penal era escassa, enfezada e carrasquenha. Apenas arranhava a epiderme da lídima ciência penal cujo estudo, por isso mesmo, tornara-se desinteressante e tedioso. (…) Por outro lado, a tímida jurisprudência não voava mais longe que um curiango. Salvo um e outro julgado de maior fôlego, limitava-se à obsedante enunciação de algumas regrinhas, de contestável acerto, mas que, à força de se repetirem, haviam adquirido o cunho de verdades axiomáticas”. A verrina não poupou os defensores: “Aos advogados criminais nada mais era preciso que cultivar o gênero patético ou estilo condoreiro e imprimir a marca de ciência exata às locubrações do nihilismo penal cuja bandeira vermelha fora desfraldada por Cesar Lombroso” [1].
O CP de 1940 acabou com aquela “tese” em seu art. 24, I: “Não excluem a responsabilidade penal: a emoção ou a paixão”. (continua)